Acabar com as torcidas organizadas do
futebol brasileiro: este é o desejo do senador mais votado de São Paulo, Major
Olímpio, que esteve no Allianz Parque na entrega da taça de campeão brasileiro
ao Palmeiras.
Eleito com 9 milhões de votos, Major
Olímpio (PSL) pretende retomar projeto de lei de 2015, que pede a extinção
destes grupos de torcedores no futebol.
“As organizadas se tornaram máquinas da morte
e do tráfico”, disse, em entrevista ao Estado.
Para o senador, as instituições
esportivas se tornaram fachada para o crime organizado.
O texto da lei proíbe a criação de novas
organizadas e pede a extinção das já existentes, alegando como justificativa a
violência e o crescimento no número de brigas.
Neste ano, foram 13 mortes comprovadas
em decorrência de brigas e outras oito estão sob investigação, segundo pesquisa
da Universidade Salgado de Oliveira (Universo-RJ), coordenada pelo sociólogo
Maurício Murad.
Nos últimos cinco anos, o número de
eventos violentos nas séries A, B e C do Campeonato Brasileiro aumentou.
Se comparado com 2014, os casos
registrados subiram 81%.
Já o número de mortes (oficializadas e
sob investigação) saltaram para 19% em relação a 2017, quando foram registrados
17 óbitos.
“A presença de mais nomes ligados à segurança
e às polícias pode facilitar a aprovação da lei”, acredita Olímpio.
Segundo levantamento feito pelo
Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), a chamada “bancada
da bala”, que é ligada à segurança pública, cresceu de 35 para 61 deputados na
Câmara e contará com nove senadores a partir de 2019.
Murad avalia que a partir de 2010 houve
uma infiltração de grupos ligados ao tráfico de drogas e de armas nas
organizadas.
No entanto, ele questiona a eficácia do projeto.
“Quem acha que extinguir as torcidas vai
diminuir a violência é quem não conhece a situação”, diz.
Segundo ele, deveria haver um plano para
reprimir esses grupos infiltrados, juntamente com medidas de caráter
preventivo.
O projeto foi apresentado há três anos,
quando Olímpio era deputado federal pelo PDT-SP e chegou a ser votado pela
Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado da Câmara.
À época, o relator Carlos Henrique
Gaguim (PTN-TO) divulgou parecer negativo alegando que o projeto feria o artigo
5º da Constituição – direito à livre associação.
Para a professora de direito penal da
FGV, Maíra Zapater, a torcida organizada se enquadra como parte do exercício do
direito de reunião para fins pacíficos, previsto na Carta.
“Considerar, de antemão, que a organizada não
é uma reunião para fim pacífico fere esse direito constitucional.”
Um texto substitutivo pedindo a
penalização individual aos envolvidos em brigas foi aprovado pelo deputado
Gaguim e seguiu para a Comissão de Esporte (CESPO), mas ainda não chegou a ser
discutido.
Presidente do PSL, partido de Olímpio,
Luciano Bivar admite não ter conhecimento sobre o projeto.
Ele concorda, porém, que é necessário
haver controle sobre os torcedores que brigam nos estádios.
“Muitas delas (das torcidas uniformizadas) se
articulam de tal maneira que ficam uma força maior até do que os próprios
clubes”.
Bivar foi eleito deputado federal por
Pernambuco e é ex-presidente do Sport, que caiu para a Série B.
Olímpio disse que o projeto original
veio após um pedido do próprio Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e da
Polícia Militar (PM-SP) a fim de solucionar os problemas de violência no
futebol.
Procurados, o MP informou que não irá se
manifestar sobre o caso e a PM não respondeu ao questionamento.
REAÇÃO
Membros de organizadas chegaram a fazer
campanha contra a candidatura de Olímpio.
A Mancha Alviverde, do Palmeiras,
classificou o parlamentar como um “inimigo
das organizadas” e divulgou nota em seu site pedindo aos associados que não
votassem nele.
“Já existe lei que regulamenta as torcidas, o
Estatuto do Torcedor, então faça-se cumprir”, diz André Guerra,
presidente da torcida.
“Não tem como proibir a existência das
torcidas. A realidade sempre encontra brecha para poder burlar a lei e se impor”,
entende o sociólogo Murad.
Maior organizada do Corinthians, a
Gaviões da Fiel também questiona a ação de Olímpio.
“É preciso punir o indivíduo, o CPF, não o
CNPJ. Quando um soldado da Polícia comete ato ilícito, ninguém pede a extinção
da PM, até porque isso não resolve. Punem o indivíduo e essa mesma lógica tem
de servir para as torcidas”, opina Jerry Xavier, da Gaviões.
Segundo Bernardo Buarque de Hollanda,
pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a medida puniria torcidas
predominantemente festivas, sem histórico de brigas, em detrimento de grupos
violentos.
“A medida do senador adota a postura e a
solução mais cômoda para as autoridades: proíbem-se todos e tudo, sem apurar
quem pratica atos violentos”.
A punição individual seria uma medida
mais eficaz para o especialista.
“A Inglaterra só obteve êxito no combate ao ‘hooliganismo’
quando passou a aplicar punições individualizadas e pesadas aos envolvidos em
brigas.”
(Estadão Conteúdo)
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