quinta-feira, 20 de maio de 2021

RESTAURANTES SELF-SERVICES NÃO RESISTEM À PANDEMIA E FECHAM AS PORTAS

*Associação estima que 40% dos estabelecimentos já tenham deixado de existir no país.
Nas regiões com grande concentração de escritórios, o trabalho em home office e as medidas de restrição reduziram drasticamente a clientela – e têm provocado o fim – de estabelecimentos formatados especialmente para servir refeições rápidas para quem almoça fora, um sucesso de público até a pandemia: os restaurantes por quilo ou self-service.

Em São Paulo, em bairros como Itaim Bibi, Vila Olímpia, Brooklin, Faria Lima, no lugar das cenas de filas na entrada dos restaurantes e de grupos de colegas de trabalho caminhado pelas calçadas, agora o que se vê são placas de "vende ou aluga" nas fachadas de diversos negócios que sucumbiram à crise.
Nos 'quilos' que continuam com as portas abertas, o número de clientes por dia não chega nem a 10% do movimento pré-Covid.
Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), antes da pandemia eram 200 mil restaurantes deste tipo espalhados pelo país.
Agora, a estimativa é que o número tenha sido reduzido para 120 mil.
Ou seja, 80 mil estabelecimentos do gênero deixaram de existir.
O setor de bares e restaurantes tem sido um dos mais atingidos pela pandemia.
A associação estima que 335 mil bares e restaurantes já encerraram as atividades em definitivo no país, considerando todos os segmentos, com uma extinção de 1,3 milhão de postos de trabalho.
Só no estado de São Paulo, cerca de 50 mil estabelecimentos fecharam as portas, sendo 12 mil na capital paulista.
O vídeo abaixo mostra quatro estratégias de pequenos empreendedores contra a crise durante a pandemia.
O G1 conversou com empresários e representantes do setor sobre o impacto da pandemia e sobre o futuro do sistema por quilo. Leia abaixo os depoimentos:
“NÃO AGUENTEI”
A empresária Meire Pedroza, de 55 anos, conta que decidiu encerrar o restaurante self-service que tinha havia 20 anos e que empregava 15 funcionários na Vila Olímpia após a clientela sumir e diversas empresas do bairro terem decidido prorrogar por tempo indeterminado o home office.
Antes de decidir pelo encerramento definitivo do "Sweet Tomatoes", ela ainda tentou manter uma operação mais enxuta, com apenas metade do imóvel alugado e um número menor de funcionários.
"Servia mais de 400 refeições por dia. Quando tentei voltar, comecei a receber 14, 25 clientes no máximo. Vi que não dava, que as pessoas não estavam nas empresas e não aguentei", afirma a empresária, que entregou o imóvel ainda no final do ano passado.
Ela estima ter acumulado um prejuízo de quase R$ 500 mil. 
"Tudo que tinha dentro valia R$ 200 mil, eu vendi por R$ 50 mil. Foi o único valor que consegui pegar. Vendi tudo: freezer, câmara frigorífica, mesas, cadeiras, caixas. Tenho até um trauma que nem passo mais na rua do restaurante", diz.
“DELIVERY É MUITO FRACO”
O empresário Cássio Horita conta que concluiu que, em razão da pandemia, não fazia mais sentido manter o restaurante por quilo "Bendita Panelinha", que funcionou por 6 anos no Centro de São Paulo.
Horita decidiu encerrar o negócio após acumular uma dívida de R$ 150 mil e não conseguir empréstimo no Pronampe, programa federal de apoio a micro e pequenas empresas.
Ele conta que, antes de fechar as portas em setembro do ano passado, ainda tentou garantir a sobrevivência do restaurante oferecendo o serviço delivery.
"O restaurante dependia muito dos escritórios, e o Centro tem o agravante que é uma região onde o delivery é muito fraco, tanto em função da densidade de moradores como de acesso. Os motoboys não conseguiam nem chegar com a moto no restaurante", diz.
O empresário ainda mantém uma sociedade em outro restaurante na Mooca, o Neri, mas lá o self-service foi abandonado temporariamente e substituído pelo cardápio com pratos executivos.
"A venda de salão é ridícula. Estou tentando sobreviver com o pouco de delivery que consigo fazer na região", afirma.
Ele explica, porém, que o faturamento atual chegou só a 20% do volume pré-pandemia e que teve que reduzir o quadro de funcionários, de 20 para 8.
"O nosso fôlego é só até virar o ano", afirma.
"Por mais que eu tenha acesso a dinheiro, não vou mais me endividar com banco. O que pode salvar é a vacina e o retorno dos clientes".
“TODOS ESTÃO SOFRENDO”
A associação que representa bares e restaurantes em São Paulo (Abrasel-SP) avalia que, em meio às incertezas relacionadas à reabertura da economia, muitos outros fechamentos ainda devem ocorrer.
Só na região da Berrini, a reportagem do G1 identificou ao menos 13 restaurantes que foram encerrados.
"Todos estão sofrendo. Todo mundo se endividou com fornecedores, banco, funcionário e fisco achando que 2021 seria melhor, e foi bem pior", afirma Percival Maricato, diretor da Abrasel-SP, acrescentando que "todo santo dia" recebe a notícia de estabelecimentos fechando as portas.
Segundo ele, os restaurantes por quilo e os bares voltados para o atendimento noturno têm sido os segmentos mais afetados do setor. 
Para os estabelecimentos self-service, cujo modelo é baseado na alta rotatividade em um período de poucas horas, as contas simplesmente "não fecham" mais.
"Muitos não vão se recuperar nunca mais. E são pequenos empresários, pessoas que acumularam seus recursos em décadas de trabalho e agora perderam, e estão fechando endividados", diz Maricato.
“MEU FÔLEGO NÃO AGUENTA MUITO MAIS TEMPO”
Maria Teresa Dias, proprietária do restaurante Espaço Hibisco, na Vila Olímpia, decidiu continuar mantendo o restaurante aberto mesmo operando no prejuízo em respeito a clientes antigos que continuam trabalhando fora de casa.
Ela conta que atendia em média 320 pessoas por dia antes da pandemia.
"Na segunda-feira, atendi 13 pessoas. Na terça, atendi 23, na quarta,13 pessoas, na quinta, atendi 27, e na sexta atendi 10 pessoas", diz a empresária.
"Não vale a pena manter aberto. Mas o que acontece: se ficar fechado também não é legal, porque os poucos que estão indo são clientes bem antigos. Tem um pessoal que anda bastante para vir até o meu restaurante".
Para garantir a sobrevivência do “quilo”, a proprietária conta já ter vendido um carro, usado a reserva financeira de R$ 350 mil que tinha acumulado, renegociado o aluguel e contratos, além de ter contratado um empréstimo de R$ 150 mil através do Pronampe.
Ela afirma, porém, só ter fôlego para "bancar o prejuízo" por mais alguns meses.
"A programação do governo de São Paulo é vacinar todo mundo até o final de agosto. Eu estou acreditando nisto, porque meu fôlego não vai mais aguentar muito mais tempo que isso", admite.
Para ela, continuam faltando mais medidas de apoio ao setor, sobretudo um alívio nos impostos por parte de todas esferas do governo.
"Eu tenho que manter a empresa viva para poder saldar as dívidas que eu já fiz. Estamos pagando o IPTU integral há um ano e cinco meses. Deveríamos estar sendo isentados. Tivemos que pagar até taxa de fiscalização e taxa de anúncio para a Prefeitura. Se você está proibido de trabalhar, como é que vai pagar o imposto?", questiona.
“FUTURO DO QUILO”
Com a permanência do home office e incertezas em torno da reabertura total da economia, o movimento de devoluções de imóveis ou de redução da área de escritórios nos grandes centros urbanos segue em alta.
Levantamento da consultoria JLL, que monitora o mercado imobiliário, mostra que a chamada taxa de vacância, que calcula o percentual de imóveis vazios, voltou a crescer em São Paulo no 1º trimestre, atingindo 24,1%, contra 22,4% no final do ano passado.
Na cidade de São Paulo, as regiões com maiores devoluções de imóveis em prédios de escritórios no 1º trimestre foram a da Marginal Central (-36,4 mil m²), a da Berrini (-28,0 mil m²), a Faria Lima (-13,6 mil m²) e Alphaville (-10,7 mil m²).
A avaliação geral é que o esvaziamento das áreas comerciais deve permanecer até que a população esteja vacinada e se sinta mais segura para voltar a circular pelas ruas.
É praticamente consenso, porém, que o futuro do trabalho tende a ser de modelo híbrido, com divisão entre dias presenciais e em casa, o que resultará numa movimentação menor de pessoas no ambiente de trabalho e em mudanças nas rotinas e áreas dos escritórios.
Embora a sobrevivência dos restaurantes por quilo dependa da aceleração da vacinação e da volta dos trabalhadores aos escritórios, a avaliação do setor é que o sistema self-service não irá morrer.
"Vai abrir um buraco no mercado, mas será preenchido por outros empresários que vão aparecer. O restaurante por quilo é um verdadeiro achado, uma tremenda solução para quem quer almoçar de forma rápida e equilibrada. Não vai acabar nunca. Mas, infelizmente, esses que estão fechando talvez não voltem mais", lamenta o diretor da Abrasel-SP.
Para os empresários, o que determinará o futuro do self-service é a demanda.
"É o sistema mais justo, o cliente pega o que ele quer", afirma Maria Teresa, lembrando que o protocolo inicial que recomendava que funcionários servissem os pratos foi rapidamente rejeitado pelo público. "Deu muita confusão. Um queria o feijão em cima do arroz, o outro, do lado. Ninguém quis, tanto que foi abandonado", diz.
Horita também acredita que o público voltará a preferir o sistema self-service e diz que pretende retomar o bufê por quilo assim que a clientela dos escritórios reaparecer.
Já Meire mantém o sonho de voltar a ter um restaurante próprio, mas talvez em um outro formato.
"Eu acredito que no ano que vem vamos ter uma quadro diferente. Daí pode começa a dar aquele comichão de abrir de novo, talvez um bistrô ou uma coisa pequena", afirma.
(Por Darlan Alvarenga, G1 — São Paulo)

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