A vereadora Raíssa Lacerda, presa nesta quinta-feira (19/09), em uma operação contra aliciamento violento de eleitores, articulou com uma facção criminosa para impedir que outros candidatos fizessem campanha em áreas dominadas pelo grupo.
As informações são da investigação da
Polícia Federal.
Raíssa é suspeita de liderar um esquema
que utilizava de violência e de outros meios ilegais para tentar obrigar
eleitores de determinados bairros a votar nela.
As investigações da Polícia Federal
apontam que a suspeita Kaline Rodrigues articulava com líder de facção criminosa
para conseguir votos para Raíssa no bairro Alto do Mateus, em João Pessoa.
O g1
teve acesso aos documentos da investigação contra os alvos da Operação
Território Livre.
Na primeira fase foram apreendidos o
celular da vereadora Raíssa Lacerda e mais de “36 mil reais” em dinheiro.
Ao analisar o celular da vereadora, a
Polícia Federal encontrou uma conversa da funcionária pública Kaline Neres Do
Nascimento Rodrigues com um líder da facção criminosa “Nova Okaida” na região
do Alto do Mateus.
Segundo a PF, Kaline enviou as conversas
para a vereadora como forma de “prestação de contas”, no dia 22 de maio de
2024, por volta das 21h.
Kaline Rodrigues enviou para a vereadora
uma série de mensagens de áudios que ela trocou com David Sena de Oliveira,
apelidado de 'Cabeça', citado pela PF como “gerente do tráfico”, responsável
pelo tráfico de entorpecentes na região.
Em um áudio, Kaline pede que o
traficante apoie a candidatura de Raíssa Lacerda e que o homem impeça a entrada
de outra candidata a vereadora na região.
A funcionária pública cita uma discussão
com a candidata concorrente nas eleições de 2020, com justificativa de
desavença política.
Kaline Rodrigues também expressa
preocupação para que a ação do traficante não chame atenção: “Como
é que a gente faz para ela não pisar mais aí embaixo, hein? Tem algum jeito? Tu
acha que tem? Sem sujar muito a ... Sem sujar para a Gestão, tu tá entendendo?
Aquela bicha é pilantra, é plitantra”, afirma a funcionária.
O líder da organização criminosa na
região, David Sena, responde Kaline com um áudio e pede que ela arrume algo
para eles ganharem dinheiro neste ano eleitoral.
“Vamos ver alguma coisa para nós arrumar uns
votos bom aí…Arrumar uma grana que é certo demais”, afirma o líder.
Kaline segue a conversa, conta que
estava estressada e tendo crises de ansiedade por causa da candidata
concorrente da região.
Ela então responde: “Eu
sei que desse uns tapas, o estresse passava… mas eu não posso, não posso, eu
sou da Gestão, não posso sujar assim não, quer queira quer não, me tornei uma
pessoa pública trabalhando com o público, entendeu?”.
O líder da facção afirma que a candidata
só entrou na região porque ele não estava lá, confirmou que vai conversar com a
mulher, mas sem chamar atenção, porque ele não quer que ela se torne vítima.
“No dia que ela descer e eu tiver, ela não
desce mais nunca, eu embaço na hora…”, afirmou o traficante.
“A demora é só eu ver ela, quando eu ver ela,
eu vou chamar a atenção dela, de um jeito aqui na limpezinha pra não… sujar
também, né? Pra depois ela não tá dizendo, ‘não porque fulano tem conhecimento
com ciclano’ e tipo querer se tornar vítima na parada, que ela só desce quando
eu não tô, na outra vez que ela veio com conversinha pra mim, eu disse: não,
não quero ideia com ninguém não e tal, mas quando eu ver ela, uma hora ela vai
querer aparecer, aí o cara corta as asinhas dela”, afirmou o
traficante.
A negociação entre Kaline Rodrigues
explica para o chefe do tráfico que Raíssa Lacerda precisa de votos e que a
vereadora deve conversar com traficante em breve.
A funcionária também promete conseguir
carros alugados pelo município para o pai do traficante e cargos públicos.
“Raíssa ganhar e não ganhar em alto, nada
feito, tu tá entendendo? Os seus planos futuros, precisa de voto, de voto,
precisa dizer assim, a pessoa vai ficar...é, é... a gente vai ter votos... a
Raíssa vai conversar com vocês mais à frente um pouquinho”, afirma
Kaline.
Raíssa Lacerda recebeu os áudios
trocados entre Kaline Rodrigues e o traficante.
A vereadora confirma que ouviu todas as
mensagens e mandou a funcionária contar para o traficante que ela tinha o apoio
de uma liderança da organização criminosa ainda mais forte, que está foragido
do sistema prisional.
Kaline pergunta se o traficante é da
mesma facção que o contato dela.
“Se não for, Deus me livre”, comenta
a funcionária.
Raíssa não responde, mas Kaline conta
para o traficante sobre o apoio.
Ele responde a funcionário com um áudio:
“Era isso que eu queria ouvir… hehehe. Ajeita
aí, marco o dia, você diz o dia e a hora, qualquer lugar até de baixo aí, até
nesse negócio aí do trem, tranquilo, aonde for tranquilo”, afirmou o
traficante.
No trecho final da conversa, o
traficante pede para Kaline Rodrigues ficar tranquila porque ele apaga todas as
conversas, e garante que vai conseguir “voto com força” para Raíssa Lacerda.
O líder também reforça que vai conversar com a candidata a vereadora
concorrente.
“Mas vai dar certo, nós vai na luta aí e nós
vai arrumar voto com força pra ela, pode ter certeza, pessoal da beira da linha
aqui, de vez em quando vai muito na cabeça desses outro povo aí, tá ligado? Que
vem dá uma de dois, essa [candidata] isso e aquilo, mas demora só chegar no
pessoal e trocar uma ideia assim, conversar um pouco, e se eu ver ela, ela não
desce aqui mais não, pode ter certeza disso, vou arrumar uma forma de chamar
atenção dela aqui, pra ela nunca mais nem descer nem descer aqui”,
afirmou.
A Polícia Federal afirma que a conversa
tem como objetivo beneficiar Raíssa Lacerda através do controle de território
no Alto do Mateus e coação para o voto.
Ainda segundo a PF, o controle
territorial do traficante é reafirmado e colocado à disposição de uma campanha
eleitoral em troca de facilidade de acesso aos bens públicos.
A investigação também destaca que está
claro que Kaline e Raíssa tinham consciência que estavam conversando com um
traficante e contavam com seu controle sobre aquele território.
(Do g1 PB)
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