quarta-feira, 16 de setembro de 2020

“VOU BUSCAR ALUNO EM CASA”, DIZ DIRETORA DE ESCOLA COM MAIOR NOTA NO IDEB

Ninguém pode faltar à aula na E.E.F. (Escola de Ensino Fundamental) Maria do Carmo Cardoso, em Independência, no sertão cearense, se não a própria diretora vai à casa do aluno entender o motivo.

"Primeiro a gente liga. Se não atender, visitamos. Temos que saber o que está acontecendo, não é?", conta Socorro Pimentel, 52 anos, animada.
O bom humor é justificável: a escola municipal, que dirige há oito anos, teve a melhor avaliação do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) do Brasil nos anos iniciais do ensino fundamental (1º ao 5º ano): 9,8.
As notas por escolas e municípios do Ideb 2019 – antes  da pandemia – foram divulgadas ontem, pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), ligado ao Ministério da Educação.
Nesta mesma categoria, o Ceará foi o sexto estado mais bem colocado, com índice de 6,3 – o sexto avanço consecutivo desde que o exame foi criado, em 2005.
Para a diretora, os bons resultados são reflexo do investimento em alfabetização feito progressivamente há décadas.
Sob a gestão de Pimentel, a Maria do Carmo Cardoso já ganhou duas vezes o prêmio Escola Nota 10, entregue pelo governo cearense, e, agora, teve o primeiro lugar no exame nacional.
Ela credita o sucesso a dois pontos em especial: a jornada quase integral dos alunos no 5º ano e o envolvimento ativo da escola com as famílias de seus estudantes.
"Um dos principais desafios é sempre manter os alunos na escola. Porque, hoje, a gente sabe que eles perdem o interesse pelos estudos com muita facilidade. Então, a gente busca sempre uma parceria com a família", diz.
É comum que os pais dos alunos participem de atividades na escola e tenham reuniões periódicas com o corpo docente.
Se algum estudante não vai à aula e não dá satisfação, Pimentel vai pessoalmente à casa dele entender o que aconteceu.
"Eu, como diretora, com a coordenadora ou professora, vou buscar em casa, entender o que acontece junto à família, só assim você tem êxito", afirma.
Em último caso, se houver um "problema mais sério", eles procuram o Conselho Tutelar.
"Mas, graças a Deus, não estamos tendo nenhum problema como esse agora. Estão todo indo."
Além disso, para estimular o interesse dos alunos, a escola tem ainda uma jornada dupla para os alunos do 5º ano: disciplinas curriculares pela manhã e atividades pedagógicas à tarde. 
"Oficinas, gincanas e atividades que atraem a atenção desse estudante, para não ficar só no quadro branco", afirma Pimentel.
"É PEQUENA, MAS NÃO FALTA NADA"
Localizada na área urbana da cidadezinha no sertão cearense, a 300 km de Fortaleza, a Maria do Carmo é uma escola pequena.
São apenas seis salas, divididas pela manhã para o fundamental 1, à tarde para o 2 e à noite abriga duas turmas de EJA (educação de jovens e adultos.
Não há quadras esportivas e o pátio é "pequeno, muito pequeno mesmo", reforça Pimentel.
O lazer é feito, quando possível, em um campo público de futebol a pouco mais de 1 km dali.
Mas, didaticamente, a diretora diz que "não falta nada".
Os materiais escolares estão em dia, não faltam equipamentos para os professores, as salas têm ar condicionado e a Secretaria de Educação da cidade ainda oferece apoio pedagógico com cursos aos docentes.
“BUSCA ATIVA É FUNDAMENTAL”, DIZ PEDAGOGA
Para Anna Helena Altenfelder, diretora-executiva do Cenpec (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), a estratégia adotada pela diretora é fundamental para a manutenção do aprendizado e o modelo deve ser seguido.
"Estudos mostram que, à medida que a criança cresce, os pais vão deixando de acompanhar o passo a passo escolar. Então, também é papel da escola fazer essa busca ativa para evitar evasão de alunos", afirma a pedagoga.
Segundo ela, ao mostrar uma preocupação contínua e persistente, a escola está um passo à frente de possíveis desistências.
"Muitas vezes, a escola só procura [o aluno] depois que ele evadiu, e é mais difícil trazê-lo de volta. Procurar nesses primeiros momentos é fundamental, deveria ser um esforço de todas as redes", completa.
CEARÁ TEM MODELO DE FOCO NA ALFABETIZAÇÃO
A Maria do Carmo é uma das 42 escolas de ensino fundamental do município, entre as unidades urbanas e rurais.
Com IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) de 0,632 – semelhante a países como Namíbia e Timor Leste  - a  cidade de Independência tem taxa de escolarização de 97,6% entre alunos de 6 a 14 anos de idade.
Para Altenfelder, a cidade se mostra "mais um exemplo" do modelo bem-sucedido de alfabetização empregado no estado há mais de duas décadas. 
"O Ceará tem uma política educacional que foca e prioriza a alfabetização que tem mostrado continuidade governo após governo, de diversos secretários de Educação. Os resultados não são mágicos, há uma política de colaboração entre o estado e os municípios", diz a pedagoga.
DESTAQUE NAS NOTAS DO IDEB 2019
No Ibed deste ano, além do resultado com os anos iniciais do fundamental, o estado nordestino também bateu a meta dos anos finais (do 6º ao 9º ano), com índice 5,2 quando a projeção era 4,6, e ficou a 0,1 da meta de 4,5 no Ibed do ensino médio.
Outro destaque importante foi a escola municipal E.E.F.
Nossa Senhora Aparecida, de Granja, no noroeste do Ceará, a 330 km de Fortaleza, que teve a maior nota do Ideb 2019 para os últimos anos do ensino fundamental, com 8,7.
(Por Lucas Borges Teixeira. Do UOL, em São Paulo)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.