A investigação da Polícia Federal que levou à prisão nesta terça-feira (19/11) de quatro militares do Exército e um policial federal descreve o general de brigada Mário Fernandes, um dos alvos da operação, como "um dos militares mais radicais" e influente nos acampamentos golpistas montados após a derrota de Jair Bolsonaro na eleição de 2022.
As informações constam da representação
feita pela Polícia Federal ao Supremo Tribunal Federal (STF) para pedir a
prisão dos suspeitos, que além de planejar um golpe de Estado para impedir a
posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também são suspeitos de
tramar um atentado.
As investigações apontam que eles
arquitetaram o assassinato de Lula, do seu vice Geraldo Alckmin e do ministro
Alexandre de Moraes, que à época presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Fernandes, que chegou a exercer o cargo
de ministro interino do governo do ex-presidente Bolsonaro, é apontado pelas
investigações como um dos responsáveis diretos por elaborar o plano.
O plano previa envenenar Lula e Moraes
e, em seguida, instituir o "Gabinete Institucional de Gestão da
Crise", que deveria ser ativado em 16 de dezembro de 2022.
Havia, inclusive, uma minuta pronta para
a sua criação – documento encontrado com o general Mário Fernandes.
O arquivo define a estrutura do gabinete
que passaria a funcionar após o golpe, com o general Augusto Heleno como
"chefe de gabinete" e o general Braga Netto como
"coordenador-geral". Heleno e Braga foram ministros de Bolsonaro.
Fernandes, conforme a minuta, ficaria na
assessoria estratégica do órgão, que deveria "proporcionar ao Presidente da
República maior consciência situacional das ações em curso a fim de apoiar o
processo de tomada de decisão".
MENSAGENS
COM INTEGRANTES DE ACAMPAMENTOOs policiais tiveram acesso a mensagens
trocadas entre Fernandes e integrantes do acampamento instalado em Brasília, em
frente ao Quartel General do Exército, o que reforçou a tese da influência do
militar.
Segundo a PF, Fernandes "era o
ponto focal do governo de Jair Bolsonaro com os manifestantes golpistas".
Recebia informações e provia material
financeiro e orientações aos extremistas acampados.
"Ressalta a autoridade policial
que os contatos com pessoas radicalizadas acampadas no QG do Exército reforça
que o general Mario Fernandes possuía influência sobre pessoas radicais
acampadas no QG-Ex, inclusive com indicativos de que passava orientações de
como proceder e, ainda fornecia suporte material e/ou financeiro para os
turbadores antidemocráticos”, menciona um dos trechos do documento do
Supremo.
Diante disso, ele é descrito com "elevado
grau de influência e liderança do intento golpista".
Outro ponto mencionado na investigação é
o viés radical de Mario Fernandes.
"As provas trazidas pela
autoridade policial apontam que Mário Fernandes (...) se trata, de fato, de um
dos militares mais radicais que integrava o mencionado núcleo militar, fato que
foi ressaltado pelo colaborador Mauro César Barbosa Cid em seu acordo de
colaboração premiada", cita.
A investigação identificou que, além de
ir até o acampamento em Brasília, Fernandes trocava mensagens com outros militares,
entre os quais Mauro Cid, ajudante de ordens de Bolsonaro, a fim de instigar o
plano golpista.
Em dezembro, segundo a PF, Fernandes
procurou o então ministro da Secretaria-Geral, general Luiz Eduardo Ramos, para
que o chefe tentasse blindar Bolsonaro "contra qualquer desestímulo,
qualquer assessoramento diferente".
“Será possível que nós vamos atrasar 10 anos?
O senhor tá vendo as coisas que tão acontecendo aí? Nós vamos atrasar 10 anos?
Vocês não vão fazer nada? Não é possível, eu não acredito. Não tem condição”,
afirmou Fernandes.
PUNHAL
VERDE E AMARELO
Segundo a PF, o documento de texto com o
plano para executar Lula, Alckmin e Moraes foi criado por Fernandes em 9 de
novembro de 2022.
A investigação aponta que o militar,
possivelmente, imprimiu o plano no Palácio do Planalto e, em seguida, foi até o
Palácio da Alvorada.
O arquivo de Word, inicialmente
denominado “Fox_2017.docx”, detalhou "Planejamento
- Punhal Verde e Amarelo", com informações diversas em tópicos para
executar o plano golpista, entre as quais, armamento necessário e a ideia de
envenenar Lula identificado com o codinome "Jeca" — Alckmin foi
citado como "Joca".
"Trata-se, a rigor, de um
verdadeiro planejamento com características terroristas, no qual constam
descritos todos os dados necessários para a execução de uma operação de alto
risco", descreveu a PF.
Moraes retira sigilo de reunião entre
Bolsonaro e ministros sobre suposta tentativa de golpe
REUNIÃO
COM ESTRATÉGIA GOLPISTA
Como ministro-substituto da
Secretaria-Geral da Presidência, Fernandes participou de uma reunião no Palácio
do Planalto, em 5 de julho de 2022, que discutiu estratégias golpistas para
viabilizar a permanência de Bolsonaro no governo.
O militar foi uma das autoridades que
falou no encontro, que teve a presença de Bolsonaro, ministros, assessores e
cúpula militar.
Ele defendeu ações antes das eleições, que
seria realizada em outubro.
"No momento que acontecer, é 64 de
novo? É uma junta de governo? É um governo militar? É um atraso de tudo o que
se avançou no país? Porque isso vai acontecer. O país vai ser todo
desarticulado”, disse.
"Então, tem que ser antes. Tem que
acontecer antes. Como nós queremos. Dentro de um estado de normalidade. Mas é
muito melhor assumir um pequeno risco de conturbar o país pensando assim, pra
que aconteça antes, do que assumir um risco muito maior da conturbação no ‘the
day after’, né? Quando a fotografia lá for de quem a fraude determinar",
acrescentou.
CARREIRA
MILITAR
Segundo dados do Exército, Fernandes,
natural de Brasília, iniciou a carreira militar em 1983, na Academia Militar
das Agulhas Negras (Aman), e foi promovido em 2016 a general de brigada (duas
estrelas), o primeiro dos três postos da carreira de oficial general.
Ele comandou de 2018 a 2020 o Comando de
Operações Especiais, localizado em Goiânia, responsável por formar os militares
chamados de "kids pretos".
Esse grupo de elite do Exército tem
integrantes envolvidos na trama investigada pela PF.
Em 2020, Fernandes passou para a reserva
do Exército e assumiu cargos o governo de Jair Bolsonaro, entre os quais, o de
secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência, o segundo posto na
hierarquia da pasta.
Foi nesse meio-tempo, em algumas
ocasiões, que ele exerceu a função de ministro interino.
(Do g1)
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